O professor Carlos Costa aceitou dar a primeira grande entrevista ao blogue Jornal O Hermínio na condição de presidente da concelhia do Partido Socialista de Gouveia. Aceitou abordar as principais questões da secção partidária local e principalmente sobre o concelho de Gouveia.
Jornal O Hermínio - Bom dia professor Carlos Costa, desde já os nossos agradecimentos ao repto por nós lançado para esta entrevista.
Carlos Costa - Bom dia, eu é que agradeço.
Jornal O Hermínio - Depois de muita indefinição dentro do Partido Socialista em
Gouveia, assume a presidência da concelhia. Como revê este período recente do
PS Gouveia?
Carlos Costa: Não sei se a indefinição a que alude se refere aos dois actos
eleitorais que se apresentaram desertos. Se for, aquilo que lhe posso dizer, enquanto
militante de base e conhecedor da opinião de uma faixa alargada de outros
militantes e dirigentes, é que se traduziu num acto de maturidade, esta
capacidade de reflexão evidenciada, sem se ceder à pressão dos timings da
estrutura nacional, para que fosse possível construir uma lista forte e coesa como
aquela que se alcançou e que é do conhecimento público. Não comungo, portanto,
da sua opinião quanto à indefinição, pelo contrário as pessoas sabiam, perfeitamente,
qual a solução que desejavam.
J.H. - O que o motivou
para assumir uma lista, por sinal única à presidência?
C.C - Como tive oportunidade de dizer na entrevista que dei ao NG, decorreu
de dois propósitos distintos: o primeiro, da necessidade de conferir ao PS de
Gouveia uma estrutura capaz de enfrentar os desafios futuros, enquanto estrutura
política à escala concelhia, assente num processo de renovação sem paralelo,
onde cada elemento desempenhará funções específicas no contexto da orgânica
funcional que se pretende implementar; o segundo, da necessidade de dar voz a
sectores importantes da sociedade do nosso concelho, independentemente de terem
votado ou não no Partido Socialista. Demasiados erros de gestão autárquica têm
vindo a ser cometidos sem direito ao contraditório ou, no mínimo, com
auscultação prévia dos interessados, pelo que urge alargar essa participação no
debate.
J.H. – Nos últimos anos muito se tem falado no interior do PS Gouveia,
nomeadamente uma certa divisão no seio do órgão. Hoje a concelhia está unida?
Ou Carlos Costa terá ainda de limar arestas no que respeita à união dos
socialistas em Gouveia?
C.C- Vai para oito anos que não participo em qualquer órgão do PS de
Gouveia, pelo que seria deselegante falar de hipotéticas cisões internas. A
única coisa que lhe posso garantir é que a lista que lidero reúne um naipe de
pessoas fantásticas, disponíveis para trabalhar em prol de Gouveia. Pessoas com
créditos firmados na sociedade gouveense. O entendimento entre as pessoas é
total. Portanto a metáfora não tem qualquer enquadramento, encontram-se toda a
gente unida em prol de objectivos comuns
J.H. – Olhando agora
para os últimos doze anos o que faltou ao PS Gouveia para impor-se
eleitoralmente, sobretudo no pós Santinho Pacheco? Terá sido mal acautelada a
sucessão?
C.C- Essa é uma questão complexa, desde logo porque envolve um período
temporal alargado, pessoas e contextos diferenciados. O único facto concreto,
nesta sua questão, é que o PS não conseguiu fazer vingar as suas propostas
junto do eleitorado, de modo a garantir a vitória. Naturalmente, tenho uma
visão muito lúcida desse período. Todavia, este não é o tempo de “chorar sobre
o leite derramado”, encontramo-nos numa noutra etapa, com novos actores,
tentando construir novas abordagens e implementar novas práticas. Não é dizer
que vamos fazer melhor, vamos tentar fazer diferente… novos contextos, novas
estratégias.
J.H.- O PS Gouveia terá
duas vozes, atendendo que não tem “assento” em reuniões de Câmara? Haverá a voz
de Armando Almeida e a voz de Carlos Costa?
C.C.- Posso garantir-lhe que não haverá, seguramente, duas vozes.
Independentemente dos interlocutores com assento no órgão “Câmara Municipal” o
PS vai falar a uma só voz, que não subsista qualquer dúvida a esse respeito.
J.H. – Não sente uma
certa “pressão” neste novo cargo face às sucessivas derrotas eleitorais locais,
nos últimos anos?
C.C.- Como sabe, não tive qualquer responsabilidade no desempenho do PS ao
longo dos últimos 8 anos, pelo que, apesar de ser solidário com os meus
camaradas, não me pode ser imputado (e de facto ninguém imputa) esse ónus: o
das sucessivas derrotas. O futuro próximo do PS Gouveia começou no dia 28 de
Fevereiro e faço tenção de fazer funcionar a CPC do PS - Gouveia numa
perspectiva sistémica, o que exigirá, de cada um, responsabilidades específicas,
porque estamos a falar de um órgão colegial, de modo a que o projecto se apresente
partilhado e haja co-responsabilização sobre as decisões. Porém, darei a cara
pelo que vier a acontecer e, assim sendo, a responsabilidade maior será minha.
Se chama a isso trabalhar sobre “pressão”, então ela encontra-se controlada
como, aliás, é normal em tudo o que faço na vida. Em suma, não me revejo nesse
“colete-de-forças”, por considerar que a exigência se deve configurar como algo
de natural nas nossas vidas.
J.H.- Que retrato faz
destes primeiros meses de governação de Luís Tadeu à frente do Município de
Gouveia?
C.C.- Sinceramente, gostaria de poder dizer que o balanço é positivo. Como
residente e contribuinte no concelho desejaria… Porém, como não alcancei uma
linha consistente de pensamento no programa que o PSD apresentou, aquando das
eleições autárquicas, as expectativas também não eram grandes. Constato, hoje,
que aquilo que se faz é navegar à vista! Não sei se o actual presidente
pretende continuar na linha daquilo que foi a gestão anterior, da qual é
co-responsável ou, pelo contrário, se já renunciou à herança e pensa seguir um
percurso alternativo. O que vejo são trapalhadas com questões que se revestem
da maior importância para muitos gouveenses, começando pela empresa municipal…
J.H. – Tem percepção da
situação financeira da Câmara Municipal de Gouveia?
C.C.- É óbvio que tenho uma percepção e resulta dos dados oficiais, aqueles
que são apresentados para publicação em estatísticas periódicas do INE.
Todavia, esta é uma matéria sobre a qual só conseguimos ter uma ideia concreta
quando temos acesso a toda a informação que, por via de regra, nos trás sempre
surpresas desagradáveis. Para já, lido com o que se encontra plasmado no(s)
orçamento(s), revisões do dito e contas de gerência… mas temos de concordar que
não é famosa.
J.H.- Num concelho cada
vez mais envelhecido , onde o jovens não encontram espaço, que lhe parecem as
medidas do programa eleitoral do PSD que
agora irão avançar ?
C.C.- Francamente, muito vagas e imprecisas. O programa foi um saco vazio
de ideias, como já fiz questão de sublinhar, uma mão cheia de nada e outra de
coisa nenhuma, relativamente ao que se apresenta como estruturalmente
importante de se fazer. Podia dar-lhe exemplos, medida a medida, sector a
sector. O programa do PSD resultou nuns quantos soundbites inconsequentes. Mas
para que não pareça que estou apostado numa abordagem derrotista, dou-lhe um
exemplo: o da mais recente medida apresentada e aprovada, que foi a do
incentivo à natalidade. Percebe-se que não se encontram esclarecidos sobre o
que fazem: uma política natalista não consiste dar cheques ou vales de compras
no comércio local… qualquer aluno do ensino secundário conseguia fazer melhor
do que isso.
J.H. – As empresas com
capitais municipais, a Gaventur e a Gouveinova continuam a existir , não se
sabe porquê e com que objectivos. Que comentário merece da sua parte esta
questão?
C.C.- Pelo que me foi proporcionado ver na pretérita Assembleia Municipal,
no que concerne ao debate sobre esta matéria, não vale a pena gastar grande
tempo com isto… do ponto de vista dos problemas estruturantes é um fait-divers que,
apesar de tudo, deixa o comum dos munícipes perplexo pela forma como tudo se
processa. Como muito bem disse, continuam a existir sem se vislumbrarem
finalidades. Mais um “inconseguimento” municipal!
J.H. – Que comentário
merece da sua parte toda a questão em torno da DLCG-Empresa Municipal? Haverá
necessidade do concelho de Gouveia ter uma Empresa Municipal?
C.C.- Já tivemos oportunidade de falar na EM, todavia, começando pela
segunda parte da questão, a resposta é não…nos moldes em que esta se encontrava
estruturada e os fins que perseguia. Quanto à problemática da sua extinção, é
um problema grave e nunca tiveram a coragem de chamar as coisas pelo nome… daí
a trapalhada em que se encontram metidos. Era mais importante ganhar eleições.
J.H.- Ter IRC a zero
no interior resolve os problemas para que empresas invistam em cidades como
Gouveia?
C.C.- Gostava de poder dizer que sim… seria fácil. Mas não, os
investimentos ocorrem quando se oferecem vantagens comparativas (consultar M.
Porter a este propósito) e elas nunca se assumem como dependentes de recursos isolados
ou expediente fortuito. Uma longa conversa, que não encontra aqui espaço,
infelizmente. Poderemos discutir quando quiser.
J.H.- Como vê este
aproximar do actual executivo liderado por Luís Tadeu ao projecto de
Girabolhos? Álvaro Amaro passou um pouco ao lado deste projecto.
C.C.- Álvaro Amaro passou ao lado e não foi só deste projecto e… Luís Tadeu
não faz a mínima ideia do que tem pela frente. Pegue no programa do PSD (dele,
Luís Tadeu) e veja o que lá consta sobre isso, um redondo e rotundo zero! Pegue
no do PS (que eu próprio estruturei) e veja o que lá vem sobre esta matéria, um
mundo de diferenças. Luís Tadeu não se aproximou de coisa nenhuma, limitou-se a
posar para a fotografia, num cenário onde Filipe Camelo assume o papel de actor
principal.
J.H. – Nenhum dos
executivos ao longo do tempo e dos anos conseguiu combater uma certa
fragmentação existente entre os sectores económicos e sociais do concelho,
juntando-os à mesma mesa em busca de soluções comuns. Será possível encontrar
um caminho comum e benéfico para todos?
C.C.- No programa do PS havia ideias muito concretas sobre como trabalhar
com os diferentes stakeholders. Havia uma linha condutora, onde cada acção
tinha uma estratégia pensada, logo o caminho encontrava-se pensado, seria longo
e árduo… mas encontrava-se delineado.
J.H. – Concorda com as
políticas na área do turismo levadas a cabo nos últimos doze anos?
C.C.- Peço imensa desculpa por não desenvolver esta questão. Apenas lhe
posso adiantar que nunca concordei. Encontro-me a finalizar um trabalho de
investigação que versa a problemática do turismo na região da Serra da Estrela,
que contou com a colaboração dos mais importantes stakeholders da região, em
formato de painel, desde académicos a gestores, passando pelas instituições ligadas
ao Desenvolvimento Rural, Ambiente e Ordenamento do Território. Ao alongar-me,
estaria a ter um procedimento pouco idóneo face ao que tem sido esta
colaboração. Quando concluir coloco a possibilidade de fazer uma sessão pública.
Então aí estarei disponível para dizer tudo o que penso e apresentar toda a
informação que coligi.
J.H.- Que opinião tem
na reforma administrativa levada a cabo pelo actual governo, nomeadamente a
Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela. Que papel poderá ter
Gouveia e como sobreviverá perante outros municípios bem mais preponderantes na
região como Guarda, Covilhã ou Fundão?
C.C.- Um tiro no pé… deixámos de ser a sub-região/Comunidade intermunicipal
Serra da Estrela para passar a ser outra coisa, essa que aí escreveu. A ideia e
ganhar massa crítica é uma ideia que serve os interesses dos municípios mais
poderosos… veja-se o papel de Luís Tadeu nisto tudo: zero, resumindo-se a uma
vice-presidência rotativa. Gouveia não vai retirar qualquer vantagem real. Sabe
que o planeamento intermunicipal, projectos e candidaturas intermunicipais, de
interesse comum, são há muito possíveis de realizar. Não era necessário entrar
por aqui. Tecnicamente podia explicar-lhe a razão desta minha posição,
designadamente através da sustentação de uma avaliação dos recursos, onde a
imagem de marca assume papel preponderante. Isto tem ares de casamento de uma certa
aristocracia falida, que vende o seu bom nome em troca de um suposto dote.
Alguém lucrará com a boda, mas não será Gouveia, certamente.
J.H. - Face à descredibilização dos políticos actualmente, consigo será
mais do mesmo ou os gouveenses poderão ter outras expectativas?
C.C.- Abstenho-me de comentar, por razões óbvias. Vamos dar tempo ao tempo.
Há quem diga que eu não tenho feitio para ser “político”, pela verticalidade
que coloco em tudo o que faço … Tecnicamente encontro-me bem preparado, embora
não tenha colocado como prioridade a vida política na minha “shortlist”. Os que
me são próximos sabem que não, sempre apontei para outras direcções. Porém,
como se costuma dizer: “nunca digas: desta água não beberei”. Aconteceu, mas há
coisas de que não abdico: não pretendo ser mais um “político”.